terça-feira, 9 de novembro de 2010

Presença norte-americana de João Maria - 1

VASCULHANDO A REDE
 

Começamos as postagens com o túmulo de João Maria de Agostini por algumas razões básicas.
1. O monge, ou "solitário eremita", como se apresentava, parece ter sido o lançador das bases do catolicismo popular que impregnou as populações dos sertões do Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina, missão continuada por outros monges - a historiografia fala em outros dois, mas existiram vários. Percorrer os meandros dessa religiosidade é importante para a compreensão do que historiadores como Paulo Pinheiro Machado(1) e Maurício Vinhas de Queiroz(2) denominam de Movimento Social do Contestado. Religiosidade que se mantém presente, conforme podemos verificar no estudo indicado abaixo, que tem  base no Evangelho de São João, conforme demonstrado por Ivone Gallo(3). 

2. A historiografia brasileira desconhecia o destino do monge, o local de seu sepultamento. Os que pesquisaram mais detidamente o personagem, como Oswaldo Rodrigues Cabral(4), falam de seu desaparecimento quando estava em Sorocaba-SP, pelo ano de 1860 ou depois. A descoberta pode parecer sem importância, mas não é, uma vez que acrescenta importante elementos ao que se tem sobre Agostini. Assim como acrescenta a informação de que deixou a Europa por volta de 1830, tendo permanecido cerca de 14 anos na Argentina, junto a Rosas, onde cumpriu pena de alguns meses e depois se estalebeceu no Brasil, por volta de 1844*. Os detalhes da presença de João Maria de Agostini em terras argentinas serão abordados oportunamente. Cabe destacar que historiadores brasileiros discutem se Agostini chegou da Itália ao Brasil em 1844 ou antes ou depois. E perdem a pista do mesmo na década de 1860.

* Essa informação não é correta, conforme alerta feito por Alexandre Karsburg e Paulo Pinheiro Machado. O tempo de permanência de José Maria em Buenos Aires foi bem menor. Voltaremos ao tema. (Observado às 23h42 de 13.11.2010).

[O historiador Oswaldo Rodrigues Cabral, que seguiu os rastros do monge no Brasil e produziu trabalho notável, localiza-o no Pará, São Paulo (Sorocaba), Paraná (Lapa), Santa Catarina (Lages) e Rio Grande do Sul (Campestre, em Santa Maria, e Botucaraí, em Candelária), cidades e localidades nas margens do Caminho das Tropas.]

3. O mérito da descoberta do destino norte-americano de João Maria de Agostini é do historiador gaúcho Alexandre de Oliveira Karsburg, feita durante a elaboração de sua tese em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro sobre o tema. Um resumo do estudo pode ser conferido em "O eremita do Novo Mundo: a trajetória de um italiano pelos sertões brasileiros no século XIX". (PDF)

Informa Karsburg: "Depois de ter estado em Sorocaba (2ª vez) e na Lapa, na década de 1850, o eremita deixou o Brasil continuando suas peregrinações pelo continente Americano. Segundo pesquisadores norte-americanos, o eremita Juan Maria de Agostini peregrinou e curou diversas pessoas nos estados do Novo México e no Texas, na década de 1860. Morador do “Cerro Tecolote” (mais tarde tal Cerro passou a se chamar 'Hermit’s Peak'), atraiu centenas que buscavam bênçãos, conselhos e curas, realizando inúmeros prodígios com uma fonte de água localizada em uma gruta (La Cueva) em que também residiu. Somando-se às águas, passou a curar com ervas encontradas na região. Naquele Cerro foi encontrado morto por um grupo de moradores locais, a maior parte ilustres proprietários de terras que eram seus devotos. Seu corpo foi enterrado em um antigo cemitério da cidade de Mesilla, no estado do Novo México, Estados Unidos, e sua lápide continha a seguinte inscrição: 'John Mary Agostiniani– Justiniani, Hermit of the Old and New World. He died the 17th of April, 1869, at 69 years and 49 years a hermit'". Voltaremos a essa presença de João Maria nos EUA.

 
Photo courtesy of NMSU Library Archives and
 Special Collections/New Mexico State University

Notas

1. Paulo Pinheiro Machado escreveu Lideranças do Contestado (Campinas, Ed. da UNICAMP, 2004), resultado de sua tese de doutourado.
 
2. O livro Messianismo e Conflito Social, escrito por Maurício Vinhas de Queiroz, foi lançado inicialmente pela Editora Civilização Brasileira (Rio, 1966), ganhando uma reedição pela Editora Ática, volume 23 da coleção Ensaios (São Paulo, 1981).
 
3. Contestado: O Sonho do Milênio Igualitário, Ivone Gallo (Campinas-SP: Editora da Unicamp, 1999).
 
4. Oswaldo Rodrigues Cabral foi o primeiro historiador catarinense a seguir os rastros de João Maria de Agostini no Sul do Brasil, visitando grutas e fontes, cruzeiros, entrevistando pessoas, recolhendo publicações e fazendo fotografias. Os resultados desse trabalho estão em João Maria (São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1960) e A Campanha do Contestado (Florianópolis: Lunardelli, 1979).
*

Planta do Cemitério de Mesilla
(Las Cruces, NM-EUA)
 

Um comentário:

  1. Celso. O Alexandre faz uma bela busca. A passagem prolongada do monge pela Argentina abre uma nova fronteira de pistas. Tomara que defenda logo a tese e a publique.

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